quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Reforma Protestante: Causas e Consequências - Parte 2


“Tese nº 52 - Vã é a confiança na salvação por meio de cartas de indulgências, mesmo que o comissário ou até mesmo o próprio papa desse sua alma como garantia pelas mesmas.” Martinho Lutero


Em continuidade ao artigo anterior, passaremos a explanar a essência da Reforma Protestante, marco ímpar do retorno do povo de Deus à observância às Sagradas Escrituras.
Antes de adentrarmos no cerne da Reforma, necessário é, ainda que de maneira panorâmica, tecermos algumas palavras quanto aos arautos que foram utilizados por Deus para concretização desse evento. Não é historicamente correto afirmar que a Reforma Protestante foi obra exclusiva de Lutero; por respeito à verdade, há que se considerar que muitos valentes antes de Lutero ousaram se levantar contra o sistema religioso vigente, intrinsicamente corrompido, mesmo diante da possibilidade de perderem suas próprias vidas, afinal, não foi justamente este o exemplo que nossos primeiros irmãos nos deixaram diante da perseguição romana no início da Igreja Cristã?
O primeiro sobre o qual discorreremos brevemente é John Wycliffe. Homem de posições fortes e raciocínio lógico apurado, gerou grandes desconfortos às autoridades eclesiásticas ao denunciar que o “senhorio” opressor de alguns poderosos não é legítimo diante de Deus. Homem deveras admirado na Universidade de Oxford, na Inglaterra, foi perseguido em vida, até que, após sua morte, ao ser condenado no Concílio de Constança, teve seus restos exumados e queimados, com suas cinzas lançadas no rio Swift. Conforme ensina o Prof. Justo L. Gonzalez, Wycliffe se opôs aos excessos do clero romano por entender que eram contrários à vontade de Deus. vejamos:
“Qualquer pessoa tem domínio ou senhorio sobre outra somente porque Deus lhe concedeu. Mas existe também um senhorio falso e ilegal, puramente humano. Este é uma usurpação, em vez de ser senhorio verdadeiro. A Bíblia nos fornece um critério claro para distinguirmos entre os dois: Jesus Cristo, a quem pertence todo domínio, não veio para ser servido, mas para servir. (…) Aquele que procura o seu próprio bem e não servir aos seus governados é tirania e usurpação. As autoridades eclesiásticas, portanto, o papado em particular, se se empenham em impor impostos para proveito próprio, e não para servir aos que lhes estão subordinados, são ilegítimas.1” (GONZALEZ, 2007)
As doutrinas ensinadas por Wycliffe foram incômodas ao papado da época. Por recorrer à Bíblia e ao padrão de Cristo, mesmo que contra o poder temporal-religioso de seu tempo, Wycliffe é considerado pelos estudiosos como um dos pré-reformadores mais notáveis, que preparam o caminho para que Deus levantasse Lutero para o Seu propósito.
Outro gigante que não pode deixar de ser citado, ainda que brevemente, é John Huss. Este jovem homem de Deus se tornou um dos pregadores mais enfáticos e entusiasmados de seu tempo. Vivia em um período em que a Igreja Católica Romana estava sob a égide de 3 papas, simultaneamente. Como é comum aos que se levantam contra um sistema opressor estabelecido, Huss contrariou, por meio de suas pregações, os interesses de muitos poderosos do clero, a ponto de ser proibido, pelo então papa Alexandre V, de pregar na capela de Belém, da qual era o responsável. Huss teve que decidir entre a obediência a um papa de caráter duvidoso e a sua consciência em levar a verdade de Deus. Huss decide desobedecer a ordem papal e, corajosamente, pregava com cada vez mais ânimo e vigor as Palavras de Jesus, a ponto de declarar veementemente que um papa indigno, que se opunha ao bem-estar da igreja, não deveria ser obedecido. Huss foi convocado a se explicar pelo papa João XXII.
De posse de um salvo-conduto imperial, Huss vai a Constança e prova que suas doutrinas eram, na verdade, fruto da mais pura ortodoxia. Comum dos ardilosos, seus opositores deram um jeito de condená-lo à fogueira por heresia. O imperador decide retirar o salvo-conduto entregue em favor de Huss, deixando-o nas mãos de seus algozes. Por fim, no dia 06 de julho de 1415, com apenas 45 anos de idade, “Huss foi levado para a catedral de Constança. Ali, depois de um sermão sobre a teimosia dos hereges, ele foi vestido de sacerdote e recebeu o cálice, somente para logo em seguida lhe arrebatarem ambos, em sinal de que estava perdendo suas ordens sacerdotais. Depois lhe cortaram o cabelo para estragar a tonsura, fazendo-lhe uma cruz na cabeça. Por último, lhe colocaram uma coroa de papel decorada com diabinhos, e o enviaram para a fogueira. A caminho do suplicio, ele teve de passar por uma pira onde ardiam seus livros2.” (GONZALEZ, 2007)
Ao pedirem que se retratasse, mais uma vez ele negou com firmeza, até que, ao entregar sua vida, assim orou: “Senhor Jesus, por Ti sofro com paciência esta morte cruel. Rogo-te que tenhas misericórdia dos meus inimigos.” Morreu cantando salmos!
No cárcere, antes de ser sentenciado, Huss disse: “Podem matar o ganso [em alemão, sua língua natal, huss é ganso], mas daqui a cem anos, Deus suscitará um cisne que não poderão queimar.” Cento e dois anos depois de John Huss, o “cisne” afixou, na porta da Igreja de Wittenberg, as suas 95 teses contra as indulgências, ato que gerou a Grande Reforma Protestante.
Antes de deflagrar a Reforma Protestante, Lutero viveu em um convento, entregando sua vida ao estilo monástico. Homem extremamente temente a Deus, tinha no mais profundo do seu coração um pavor de seus pecados e a certeza de sua condenação. Até que, certo dia, pela profunda misericórdia de Deus, Lutero recebe o mais maravilhoso presente de sua vida. “Lutero encontrara, na biblioteca do convento, uma velha Bíblia latina, presa à mesa por uma cadeia. Achara, enfim, um tesouro infinitamente maior que todos os tesouros literários do convento. Ficou tão embevecido que, durante semanas inteiras, deixou de repetir as orações diurnas da ordem. Então, despertando pelas vozes da sua consciência, arrependeu-se de seu desleixo: era tanto remorso, que não podia dormir. Apressou-se a reparar o seu erro: fê-lo com tanto anseio que não se lembrava de alimentar-se.” (BOYLER, 1995)
Esse é apenas um pequeno trecho da vida de Lutero, que ratifica seu profundo temor a Deus e à Sua Palavra.
Voltando à deflagração da Reforma, após o evento das 95 teses, Lutero foi excomungado pelo papa Leão X. convocado a comparecer diante do Imperador Carlos V para responder pessoalmente aos seus acusadores, embora desestimulado a tal por seus amigos, Lutero certo de sua causa, não hesitou, conquanto lhe tivessem alertado do ocorrido anos antes com Huss.
É importante apontar que este Carlos V era, nada mais nada menos, que o neto de Isabel, a Católica, citada no artigo anterior. Daí pode-se depreender o ambiente hostil para o qual Lutero estava sendo enviado.
Quando o núncio papal exigiu de Lutero, perante a ínclita assembleia, que se retratasse, ele respondeu: “Se não me refutardes pelo testemunho das Escrituras ou por argumentos – uma vez que não creio somente nos papas e nos concílios, por ser evidente que já muitas vezes se enganaram e se contradisseram uns aos outros –, a minha consciência tem de ficar submissa à Palavra de Deus.”
Quanta coragem! Ao regressar de Wittenberg, Lutero foi repentinamente rodeado num bosque por um bando de cavaleiros mascarados, que o conduziram ao castelo de Wartburgo. Este foi um plano do príncipe da Saxônia para salvar Lutero dos inimigos que planejavam assassiná-lo antes de sua chegada em casa.
Foi do castelo de Wartburgo que Lutero se dedicou com extremo afinco à tradução da Bíblia para o Alemão. Lutero era douto conhecedor do hebraico e do grego, o que pela Graça de Deus o ajudou nessa árdua e nobre missão. Em apenas 3 meses, o Novo Testamento estava traduzido para um alemão que todos entenderiam; e mais, Lutero não aceitou nenhum centavo de direitos autorias pela empreitada.
Além disso, a Alemanha da época (embora ainda não tivesse esse nome) estava fragmentada em diversos dialetos locais. Já existiam outras traduções da Bíblia na época, mas na forma de um alemão latinizado, o qual o povo e os mais humildes não compreendiam. A Bíblia traduzida por Lutero serviu, também, para unificação do idioma alemão, sendo adotada até os dias de hoje.
Como consequência doutrinária da Reforma Protestante, podemos destacar os 5 SolasSola Scriptura (Somente as Escrituras); Sola Fide (Somente a Fé); Solus Christus (Somente Cristo); Sola Gratia (Somente a Graça) e Soli Deo Gloria (Glória somente a Deus).
Como não temos espaço para detalhar os 5 solas (o que poderemos fazer em um artigo a parte, se assim Deus o quiser), atentar-me-ei apenas ao Sola Scriptura (Somente as Escrituras).
Ao remetermos ao artigo anterior, lembramos que no séc. XII, o papa Inocêncio III proibiu a leitura da Bíblia por parte dos leigos, ou seja, todos que não pertenciam ao clero. Todavia, ao acessar a Palavra de Deus, Lutero pode perceber que muito do pregado pela autoridade eclesiástica de seu tempo contrariava, diametralmente, a Palavra de Deus. Desta feita, o movimento reformista apregoou que a autoridade final em matéria de fé não está, e nem poderia, nas mãos de qualquer homem que seja, mas sim na Palavra inspirada de Deus, ou seja, as Sagradas Escrituras. Assim, somente as Escrituras detêm a última Palavra em matéria de doutrina cristã, dado que foram inspiradas pelo próprio Deus, na pessoa do Espírito Santo.
Ademais, com a disponibilização da Bíblia às pessoas das diversas classes sociais, e não apenas ao clero, o povo pode começar a conferir a integridade das doutrinas religiosas da Igreja Romana perante a Palavra de Deus. Foi então que muitos dos dogmas católicos romanos caíram em completo descrédito, por contrariarem vexativamente as Escrituras Sagradas. A título de exemplo, enquadram-se nesta narrativa o dogma do purgatório, indulgências, adoração de imagens, oração pelos mortos, dentre outros.
Em reação, a Igreja Católica Romana deflagrou a malfadada Contrarreforma Católica. O que se deve destacar desse movimento é a adulteração da Bíblia. Explico: desde a tradução da Bíblia hebraica para o Latim (Vulgata) por Jerônimo, no final do séc. IV, 7 livros do Antigo Testamento (Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc, I e II Macabeus) não foram considerados inspirados, até porque não estavam contidos na Bíblia hebraica. Estes livros foram reunidos como anexos, ao final da Bíblia Latina. Jerônimo deixou claro que estes eram históricos, mas a que a Igreja Cristã não os tinha como inspirados. E assim permaneceram até a Contrarreforma Católica.
É que para fundamentar seus dogmas contrários às Escrituras, a Igreja Romana afirmou que havia alguns livros que eram canônicos (inspirados), mas que de uma segunda remessa, ou seja, Deuterocanônicos. Desta feita, foram inseridos no Antigo Testamento justamente estes 7 livros, que acabaram servindo como instrumento para fundamentar dogmas heréticos e contrários a toda a Escritura, os quais nunca foram efetivamente parte da Bíblia Sagrada, até esse momento.
Apenas a título de exemplo, no livro de Tobias (um dos livros inseridos pela Igreja Católica), um anjo mente a Tobias (Tb 5:13). Como pode um anjo de Deus mentir? Logo se vê que este texto não é inspirado. Ademais, neste mesmo livro, há o relato de que o tal anjo diz a Tobias que se ele arrancasse o coração e os rins de um peixe, e os queimasse, a fumaça teria poder para expulsar demônios (Tb 6:8). Ora meus irmãos, esse é um relato de prática de feitiçaria da época, e não é necessário muito esforço para constatar a não canonicidade deste livro.
Outro exemplo é o livro de II Macabeus (outro livro inserido pela Igreja Romana), onde o autor diz que se a narrativa ficou fraca e medíocre, foi por culpa dele, veja: “Se a composição está bem-feita e preenche sua finalidade, foi isto que desejei. Se está fraca e medíocre, é porque melhor não pude fazer.” II Mab 15:38. Ora, se esse texto fosse, de fato, inspirado por Deus, não haveria dúvida quanto à efetividade de sua mensagem, já que a inspiração divina e perfeita e plena. E é justamente o livro de II Macabeus que fundamenta a salvação pelas obras (6:18 – 7:41), o Purgatório e a oração em favor dos mortos (12:45,46) ensinados pelo Catolicismo Romano.
Por fim meus amados irmãos, muito temos que comemorar! A Providência Divina levantou homens cheios do Espírito Santo para despedaçar a opressão e religiosidade que permeou quase que completamente a Idade Média. Se hoje podemos adorar ao Senhor verdadeiramente, com acesso às Escrituras Sagradas, entendendo o que é a Graça de Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo é porque homens deram suas vidas em favor da verdadeira mensagem de Jesus Cristo! Que possamos nos alegrar e seguir o mesmo exemplo desses verdadeiros Heróis da Fé! Continuamos no próximo artigo…
Que Deus te abençoe grandemente, em nome de Jesus!
Hélio Roberto.
Twitter: @heliorsousa
Referências:
  1. GONZALEZ, Justo L.. Uma História Ilustrada do Cristianismo: A Era dos Sonhos Frustrados. Vol. 5, São Paulo: Vida Nova. 2007, p. 86.
  2. GONZALEZ, Justo L.. Uma História Ilustrada do Cristianismo: A Era dos Sonhos Frustrados. Vol. 5, São Paulo: Vida Nova. 2007, p. 102.
  3. BOYLER, Orlando. Heróis da Fé. Rio de Janeiro: CPAD. 1995. 246 p.
  4. GONZALEZ, Justo L.. Uma História Ilustrada do Cristianismo: A Era dos Reformadores. Vol 6.
  5. Bíblia Apologética, com Apócrifos. Instituto Cristão de Pesquisas.

Fonte: Artigo escrito para o site GospelPrime.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Reforma Protestante: Causas e consequências - Parte 1


“Por isto, nem o papa é a cabeça, nem são os cardeais o corpo da igreja santa, católica e universal. Porque somente Cristo é a cabeça, e seus predestinados o corpo, e cada um membro deste corpo”. John Huss


Em 31 de outubro de 2017 comemoramos os 500 anos da Reforma Protestante, um dos acontecimentos mais notáveis da História do Cristianismo, tanto no aspecto teológico, quanto no político.
Dividiremos a análise desse evento tão importante para o Cristianismo em 3 partes, cuja primeira passamos a explanar a seguir.
Tão importante quanto conhecer o teor da Reforma Protestante, é conhecermos o contexto histórico da época em que ela foi deflagrada. A Europa vivia tempos de profunda decadência espiritual, arraigada por uma Igreja corrupta e cuja liderança era devassa, pouco vocacionada e mais política do que religiosa.
É desta época a citação do colendo Prof.º Justo Gonzalez, respeitável historiador espanhol, que, ao retratar a situação eclesiástica da Espanha no final do séc. XV, teceu as seguintes palavras: “…Os filhos bastardos dos bispos se moviam no meio da nobreza, reclamando abertamente os sangue de que eram herdeiros. Até o digníssimo dom Pedro Gonzáles de Mendonza, que sucedeu a dom Alonso Carrillo como arcebispo de Toledo, tinha pelo menos dois filhos bastardos. (…) Se isso ocorria no alto clero, a situação não era melhor entre os padres paroquianos, muitos dos quais viviam publicamente com suas concubinas e filhos. E visto que tal situação não tinha a permanência do casamento, eram muitos os sacerdotes que tinham filhos de várias mulheres.” (GONZALEZ, 2011).
Não por surpresa, o papa do momento acima narrado, era o famoso Alexandre VI (Rodrigo Borja), considerado um dos papas mais corruptos da história do papado. Tinha várias amantes e filhos, reconhecidos e bastardos. Homem que se vendia facilmente, ora agradando à Isabel, a Católica – Rainha de Castela, ora se aliando à Franca, inimiga declarada de Isabel. Quem pagava mais, de pronto alcançava as graças do ambicioso papa.
Como forma de agradar a rainha de Castela, Isabel, nesse período foi concedido à coroa espanhola a autorização para que esta iniciasse a sanguinolenta inquisição católica, conhecida à época como inquisição espanhola. Nesse tempo, a criatividade dos “detentores do poder espiritual” para torturar era sem medida. Citarei, a título de informação, os 5 mais famosos meios de tortura utilizados pela Igreja Católica no período da inquisição:
Cadeira da Inquisição: tratava-se de uma cadeira de madeira maciça com cerca de 2.000 pregos e tiras de couro para amarrar o “herege”. Sentava-se o inquirido na cadeira, onde os 2.000 pregos perfuravam todo o corpo do acusado. Era comum, ainda, que os requintes de crueldade chegassem a tal ponto de os pregos serem esquentados para que os furos durassem mais tempo. Segue a foto desse cruel instrumento de tortura:

Berço de Judas: Tratava-se de uma pirâmide de madeira, na qual o “herege” era jogado nu, após ser suspenso por cordas, de modo que fosse empalado. Ocorria de duas formas, podendo o acusado ser lançado de uma vez, ou ser solto lentamente, de maneira que fosse rasgado da região do reto até à pélvica. Segue a imagem do berço de Judas, tão utilizado pela inquisição católica:

Caixão da Tortura: Tratava-se de uma gaiola de metal, na qual os acusados de blasfêmia eram suspensos em plena praça pública, lá ficando até morrer, e, então, acabavam por serem comidos por animais carniceiros. Segue a imagem do referido caixão:

Arranca Seios: Essa ferramenta era esquentada e utilizada para arrancar os seios de mulheres acusadas de aborto e adultério. Os seios eram arrancados e a vítima sangrava até a morte. Veja a imagem dessa ferramenta:

A pera: Essa ferramenta era utilizada no início das torturas. Ela era inserida na vagina das mulheres, ou na boca do torturado, e ia-se abrindo até dilacerar as mulheres, ou quebrar o maxilar do acusado. Veja a foto:

Essas ferramentas de tortura foram utilizadas no auge da Inquisição Católica, período imediatamente anterior à deflagração da Reforma Protestante. É de se admirar que os ferrenhos defensores do catolicismo romano critiquem o movimento reformista, o que, de certo modo, os torna silentes e tacitamente ratificadores das barbáries praticadas pela Igreja Católica.
Ainda quanto ao contexto teológico da época, cerca de 70 anos do evento das 95 teses, o que é pouquíssimo tempo do ponto de vista histórico, o papa Nicolau V, em 18 de junho de 1452, editara uma bula intitulada Bula Papal Dum Diversas, por meio da qual este outorgara ao rei Português Afonso V o poder de escravidão no norte da África. Era vastamente conhecido o interesse do monarca português de dominar a região norte da África. Para tanto, encontrou guarida na autoridade papal para escravizar aquela população local. Veja o que ela diz:
“(…) outorgamos por estes documentos presentes, com a nossa Autoridade Apostólica, permissão plena e livre para invadir, buscar, capturar e subjugar sarracenos e pagãos e outros infiéis e inimigos de Cristo onde quer que se encontrem, assim como os seus reinos, ducados, condados, principados, e outros bens […] e para reduzir as suas pessoas à escravidão perpétua.”
A justificativa à época era que os pagãos não tinham alma, vez que estas pairavam por sobre suas cabeças. Assim, por não terem alma, não eram filhos de Deus, o que chancelava a sua escravidão livre e deliberada. E ainda há incautos que insistem em arrazoar que a instituição Igreja Católica Apostólica Romana corresponde ao corpo místico de Cristo, esquecendo-se, ou fazendo questão de olvidar, que a Igreja de Cristo são as pessoas que o tem como Senhor e Salvador, e não uma instituição governada por homens, sejam quais forem eles. Como apregoa as Escrituras: “E acontecerá que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.” At 2:21
Ademais, as imposições e opressões protagonizadas pelo alto e baixo clero eram como uma moenda psicológica ante uma população majoritariamente pouco instruída e que carregava séculos de tradição supersticiosa gerada pelas ameaças de inferno por parte do pouco confiável clero católico.
Para entender o porquê de a população em geral ter pouco ou quase nenhum conhecimento bíblico, faz-se necessário viajar para quase 4 séculos antes da Reforma Protestante, em que o Papa Inocêncio III, em 12 de julho de 1199, na carta denominada “Cum ex iniuncto” aos habitantes de Metz, proíbe a leitura da Bíblia por parte dos leigos, ou seja, de todo aquele que não fosse sacerdote. Confira:
“O nosso venerável irmão, o bispo de Metz, nos fez saber com suas cartas que, seja na diocese, seja na cidade de Metz, uma considerável multidão de leigos e de mulheres, de certo modo atraída pelo desejo das Escrituras, fez traduzir em língua francesa os Evangelhos, as cartas de Paulo, o Saltério, os “Moralia in Iob”, de Gregório Magno e diversos outros livros; … assim, porém, aconteceu que em assembleias secretas os leigos e as mulheres presumem arrotar entre si tais coisas e pregar uns aos outros, e nem aceitam a companhia daqueles que não se associam a tais coisas (…) Também se o desejo de entender as divinas Escrituras e o zelo de exortar em conformidade com estas não mereça repreensão, mas antes, recomendação, tais porém parecem merecer censura, porque celebram pequenas reuniões próprias, usurpam para si o ofício da pregação. (…) Os abscônditos mistérios da fé não devem, porém, ser colocados à disposição de todos sem distinção, dado que não podem ser compreendidos de modo indistinto por todos, mas somente por aqueles que podem acolhê-los com uma inteligência crente. (…) Por isso, naquele tempo foi corretamente estabelecido na lei divina que o animal que tivesse tocado o monte Sinai fosse apedrejado, para que evidentemente um simples qualquer ou alguém sem instrução não presuma penetrar na sublimidade da sagrada Escritura ou pregá-la a outros. (…) Sendo pois na Igreja a categoria dos doutores de certo modo singular, não deve qualquer um de modo indistinto reivindicar para si o encargo da pregação.”
Essa carta papal simplesmente dizia que os leigos eram incapazes de conhecer as verdades de Deus nas Escrituras, devendo isto ficar a cargo, exclusivamente, do clero. Ora, o povo sequer podia ler a Bíblia, como então contestaria as heresias e mazelas praticadas por muitos dogmas instituídos pela Igreja dominante da época? O Catolicismo Romano já estava tão apartado do verdadeiro evangelho que desconsiderava que o princípio da sabedoria é o temor do Senhor, e que o Espírito Santo fala e instrui no mais íntimo de um coração temente a Deus.
Todavia, como Deus tem controle de todas as coisas, Martinho Lutero era monge e professor de Teologia, motivo pelo qual teve acesso às Escrituras Sagradas, inclusive nas línguas originais. E esse foi o evento mais marcante na vida de Lutero: poder conhecer verdadeiramente a vontade e a Palavra de Deus, percebendo que muitos dos dogmas pregados e vividos naquele momento eram meios de manipulação do povo, que em nada tinham afinidade com a mensagem de Cristo.
É bem verdade que Lutero não queria criar uma nova religião, mas corrigir as práticas heréticas do catolicismo romano. Nesse sentido, era comum à época a realização de um debate em praça pública sempre que houvesse uma divergência teológica sobre determinado ponto, de modo que o povo pudesse conhecer as duas posições divergentes. Nesse prisma, Lutero desafia o papa Leão X a um debate em praça pública para dirimir as controvérsias levantadas. Obviamente, o papa não compareceu, o que levou Lutero, no dia 31 de outubro de 1517, a afixar, na porta da Igreja de Wittenberg, suas 95 teses que combatiam as heresias dominantes, estas que iam de encontro à Palavra de Deus, contrariando o que Jesus ensinou, criando dogmas humanos eivados de pecados, sede de poder e deterioração do clero, além de impedir os pequeninos de verdadeiramente conhecerem a Deus. Estava oficialmente deflagrada a Reforma Protestante. Continuamos no próximo artigo…
Que Deus te abençoe grandemente, em nome de Jesus!
Hélio Roberto.
Referências:
GONZALEZ, Justo L.. Uma História Ilustrada do Cristianismo: A Era dos Sonhos Frustrados. Vol 5;
GONZALEZ, Justo L.. Uma História Ilustrada do Cristianismo: A Era dos Reformadores. Vol 6.
Fonte: Artigo escrito para o site GospelPrime.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Aviso: mudança de endereço do blog


Pedofilia travestida de “arte”


Abre a tua boca em favor dos que não podem se defender; sê o protetor dos direitos de todos os desamparados! Pv 31:8


É impressionante como o Brasil tem caminhado desastrosamente ao incentivo à pedofilia, esta que tem sorrateiramente se apresentado travestida de “arte”. Isso é uma covardia sem precedentes em nosso país!
Recentemente, dado a grande repercussão nas redes sociais, o Banco Santander decidiu encerrar a exposição intitulada “Queermuseu: Cartografias da Diferença na Arte Brasileira”, em função do repúdio da população brasileira diante da covarde e sofismática tentativa de erotizar crianças, com imagens retratando bestialidade e pedofilia.
Mas não pense que as coisas pararam por aí. O Ministério Público Federal da 4ª Região, por meio do Procurador da República Fabiano Moraes, editou uma peça jurídica1 ao Banco Santander recomendando a reabertura da exposição, sob pena da adoção das medidas judiciais cabíveis. Os argumentos trazidos na recomendação são completamente sem consistência, esquecendo-se do dever de tutela àqueles que mais precisam da atuação do Ministério Público, ou seja, as crianças.
Proclama a famigerada recomendação: “CONSIDERANDO que as obras que trouxeram maior revolta em postagens nas redes sociais não tem qualquer apologia ou incentivo à pedofilia, conforme manifestação pública, divulgada por diversos meios de comunicação, dos Promotores de Justiça do Ministério Público do Rio Grande do Sul com atribuição na garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes que estiveram visitando as obras.” (grifos nossos)
Veja que absurdo! Parece que o douto procurador não viu ou faz questão de olvidar o conteúdo das obras da exposição em comento. Quer dizer que os termos “Criança viada travestida” não têm conteúdo erótico? No momento em que se justapõem na mesma frase os termos “Criança”, “viada” e “travesti” não se está incentivando crianças às práticas travestis? O nome disso é doutrinação e erotização de crianças!
Erotização de crianças é uma verdadeira crueldade! A criança não sabe diferenciar sugestão, informação e ordem. Elas crescem e aprendem sob o espectro do modelo de imitação. No momento em que se erotiza crianças está a se incentivar, de forma tácita e subliminar, a própria pedofolia.
Ademais, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA prevê expressamente como crime a erotização de crianças, senão vejamos:
Art. 241.  Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: (grifos nossos)
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
Observe que a exposição de fotografia de caráter pornográfico envolvendo criança ou adolescente se enquadra no crime acima tipificado. Mas alguém pode dizer que afirmar que uma criança retratada como travesti não é pornografia. Então vamos ao significado de pornografia, segundo o dicionário Aurélio2:
Descrição ou representação de coisas consideradas obscenas, geralmente de caráter sexual;
Ação ou representação que ataca ou fere o pudor, a moral ou os considerados bons costumes.
Apor que uma criança é viada e travesti é, latu sensu, prática de atividade pornográfica. Há que se lembrar que o cerne teleológico desse dispositivo é a proteção de crianças diante de condutas erotizantes. Imagens retratando zoofilia, incentivo ao homossexualismo infantil e práticas sodomitas são, sobretudo, uma agressão àqueles que não têm maturidade sexual e cognitiva suficiente para discernir o que está por trás dessas figuras.
O mesmo Estatuto (ECA), entendendo a tenra maturidade sexual e cognitiva das crianças, proíbe que a estas sejam expostas imagens de conteúdo sexual. Vejamos:
Art. 78. As revistas e publicações contendo material impróprio ou inadequado a crianças e adolescentes deverão ser comercializadas em embalagem lacrada, com a advertência de seu conteúdo.
Outrossim, o Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos), do qual o Brasil é signatário, versa em seu art. 19, sobre a mantença dos direitos da criança. Vejamos:
Art. 19 – Toda criança tem direito às medidas de proteção que a sua condição de menor requer por parte da sua família, da sociedade e do Estado.
A condição de menor das crianças lhes dá direito inalienável de proteção! Como supramencionado, uma criança não tem condições de diferenciar sugestão, informação e ordem, motivo pelo qual o Pacto de San José da Costa Rica lhe assegura a proteção do Estado, da família e da sociedade, em virtude de sua condição de menor. No momento em que o órgão de fiscalização do cumprimento da lei deliberadamente desconsidera esse dispositivo, passamos a viver em uma quadra bastante preocupante!
Ademais, a Constituição da República apregoa que a lei punirá severamente qualquer espécie de abuso, violência ou exploração sexual da criança e do adolescente. Vejamos:
Art. 227, § 4º – A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
Essa é uma norma constitucional assecuratória. Por tal natureza, deve ser interpretada de forma expansiva. Qualquer espécie de violência sexual da criança, inclusive a psicológica, deve ser severamente punida pela lei. Nesse prisma constitucional, o ECA tipificou como crime o constrangimento de crianças. Vejamos a letra da lei:
Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento:
Pena – detenção de seis meses a dois anos.
Ainda quanto à análise da norma vigente, veja o que preconiza o Código Penal Brasileiro:
Art. 218-B.  Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos.   
O que seria, senão indução à exploração sexual de crianças, imagens que erotizam meninos e meninas? Quando se fala em “Criança viada travesti”, qual a mensagem que se está transmitindo? Como sugerir que esta frase não tem alto teor sexual?
Referindo-nos, mais uma vez, à recomendação do Ministério Público citada no início deste artigo, utiliza-se, como argumento central, o exercício da liberdade de expressão para liberação da exposição em epígrafe. Esquece-se, todavia, que não há direito fundamental absoluto, e que este direito não pode ser invocado como salvaguardo de práticas criminosas/delituosas. Ora, fundamentar erotização de crianças com fulcro no direito de liberdade de expressão é uma verdadeira aberração hermenêutica!
Por fim, é inquestionável o dever de proteção a nossas crianças por parte do Estado brasileiro, em todas as suas esferas de atuação. É de completo e veemente repúdio a posição do Ministério Público Federal da 4ª Região quanto à reabertura de exposição tão agressiva à dignidade de nossas crianças. Esperamos veementemente que o Ministério Público, que deveria atuar de forma assecuratória dos direitos da criança e do adolescente, venha a rever seu posicionamento, em respeito àqueles que não podem se defender. É lamentável, revoltante, indignante e insustentável um procurador da república defender exposição de imagens que erotizam crianças, e ainda por cima, utilizar o Ministério Público Federal para tal! Proteste! Não aceite esse impropério vergonhoso e descabido.
Se você não concorda com a posição do procurador do Ministério Público da 4ª Região, exerça sua cidadania e o seu direito de expressão, tão defendido pelo próprio Ministério Público, e envie um e-mail ao referido procurador da república, cujo e-mail está disponível no sítio oficial do MPF4: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/institucional/prdcs/contatos/, de modo que este, como ser humano que é, possa refletir e rever sua posição.
Sabemos que a atuação do Ministério Público é independente e autônoma, mas é bem verdade que o que legitima a atuação estatal é a própria sociedade.
Por fim, oremos por nosso país e por nossas crianças. Estejamos, como verdadeiros atalaias, atentos e vigilantes a tudo aquilo que tenta ser imposto a nossos filhos, ainda que travestidos de arte ou de cultura. Não podemos aceitar essa afronta à dignidade de nossas crianças.
Que nosso Senhor Jesus abençoe nosso país!
Hélio Roberto.
Referências:
  1. http://s.conjur.com.br/dl/recomendacao-mpf-rs-reabertura-mostra.pdf
  2. https://dicionariodoaurelio.com/pornografiapornografia
Fonte: Artigo escrito para o site GospelPrime.